terça-feira, 21 de agosto de 2007

Luís Inácio, Eduardo Campos, “Bernardinho” e suas respectivas “famílias”.




Percebi uma peculiar “coincidência” entre estes três “vultos” da nossa história contemporânea, no que se refere à “filosofia política” por trás do perfil administrativo de cada um. Em seus discursos, todos “confundem” a gestão administrativa pública com a administração familiar. Há, no bojo dessa “confusão”, a sutil exposição de uma personalidade tirânica revelada a partir de “atos-falhos” que demonstram muito mais do que uma mera ignorância acerca da teoria política.

Primeiro as declarações:

Luís Inácio, comentando a “coincidência” entre a maior concentração dos investimentos do seu governo no Nordeste e sua maior popularidade nessa região do país, declarou: “Devo tudo ao Sudeste. Lá, me alfabetizei, consegui trabalhar na metalurgia, entrei para o PT, me candidatei a Presidente da República... Mas, o Sudeste é mais forte e o Nordeste mais fraco. E, como um pai que gosta de todos os filhos igualmente, ajuda mais o mais fraquinho... aquele que precisa mais dele...

Eduardo Campos, durante a Greve dos Professores Estaduais, num dos seus atos políticos no interior do Estado, comentou: “Os servidores querem um reajuste que eu não posso conceder. É como um pai, que o filho quer um brinquedo... ele quer dar, mas não pode... gostaria muito de dar, mas não pode e o filho tem que entender...

Bernardinho, Técnico da Seleção Brasileira de Voleibol Masculino, sobre o escrete que comanda, afirmou: “somos uma família”... A qual, com a “preciosa ajuda da Rede Globo”, passou a ser conhecida como “a família Bernardinho”.

Não é de agora que a unidade familiar é utilizada como metáfora para determinar organizações sociais mais complexas (clubes, comunidades, sociedades, estados, etc). Esta confusão se dá, segundo Rousseau (Do contrato Social), porque, sendo a família “célula matter”, ou, “a mais antiga das sociedades (...) é, pois, a norma primitiva das sociedades políticas: o cabeça é a imagem do pai, o povo a dos filhos.”

Mas, há uma “ressalva” que sempre é omitida quando da utilização dessa antiga metáfora; esta se refere ao aspecto afetivo que envolve aquela “célula social original”.

O próprio Rousseau esclarece que “a família é a única sociedade natural” na qual os filhos se sujeitam à autoridade do pai “enquanto necessitam dele para se conservar”, isto é, SOBREVIVER. Uma vez que aprendem a sobreviverem por conta própria, os filhos buscam o desenlace social e tornam-se independentes. “Se continuam a viver unidos” acrescenta Rousseau, “não é natural, mas sim, voluntariamente, e só por convenção a própria família se mantêm”. Ou seja, continuar a viver em família após a superação da necessidade do pai como mantenedor já se traduz em uma característica cultural humana, não, numa característica natural.

Hegel, posteriormente, irá, na sua Filosofia do Direito, desenvolver essa revelação de Rousseau, caracterizando como “suprassunção” a característica humana de deixar a família original para fundar a sua própria, mesmo que mantendo laços com a primeira ao ponto de encontrar em todas essas um traço único e comum...

Mas, voltemos a Rousseau e nossos três personagens contemporâneos:

Rousseau vai explicar que a diferença entre a família e as sociedades complexas está no fato de que “na família o amor que o pai tem aos filhos paga os cuidados que ele lhes dispensa; e no Estado, o júbilo de governar supre o amor que a seus povos não dedica o maioral político”. E, mais adiante, Rousseau deixará bem claro que, se na família é o amor que matem a unidade da associação, no Estado são as leis que sedimentam tal unidade.

Bom, de posse dessas maravilhosas revelações, podemos partir para as nossas próprias...

É, a meu ver, “sintomático” que os governantes sempre apelem para a metáfora da “sociedade familiar” quando esses são os próprios representantes do “pai”. Isto é, Luis Inácio não evocou a referida analogia quando Fernando Henrique Cardoso estava no comando, nem Eduardo quando o Governador era Jarbas Vasconcelos, ou Bernardinho, quando era outro e não ele o técnico da Seleção de Voleibol.

Este “apelo” parece, então, sugerir não apenas uma visão simplista (elementar) da organização social, mas, também déspota. Isto porque, no caso dos gestores políticos, a analogia pode ser enxergada como um “ato-falho” psicológico que elimina do sistema de governo vigente, entre outras coisas, elementos importantíssimos como os poderes Legislativo e Judiciário, pois, ao “pai” cabe sozinho o “direito natural” de legislar e julgar com relação às suas famílias.

Além disso, há a tentativa de acrescentar, nos três casos, um elemento AFETIVO ao PODER POLÍTICO de cada um. Note-se que o “pai” não é o “macho alfa dominante”, isto é, o macho mais forte que comanda o bando, mas que precisa estar sempre alerta, pois, ao menor sinal de fraqueza, terá sua “autoridade” contestada e, por isso, precisará defendê-la, literalmente, a unhas e dentes... O “pai” é aquele que ama os filhos e, por isso mesmo, é amado por eles... é aquele que, quando cessa a força e o vigor físico, já adquiriu experiência suficiente para legitimar sua autoridade... é aquele, finalmente, que não poderá NUNCA ter seu poder (e título) contestado, pois, podem haver vários líderes, porém, um único e definitivo “pai”.

Quando se comparam a “pais”, lideres ou governantes podem até faze-lo por ignorância política. Mas, tal ignorância não é sinal de que fizeram simplesmente uma má e indevida associação cognitiva; do contrário, é a demonstração do que mais almejam nos recônditos de sua “psique”: um poder incondicional, inquestionável, indelével e indefectível.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Trem da Alegria



Por Denilson Laranjeira*



Prezados senhores,


O que me motiva a esta manifestação é a nota publicada hoje, sábado, 18 de agosto de 2007, na coluna sob o título "Trem da Alegria". É preciso fazer alguns adendos e reparar a verdade sobre a relação entre as entidades representativas dos trabalhadores do serviço público e os projetos legislativos contrários ao interesse público.


Sou funcionário (não deveria ser necessário, mas agora talvez seja preciso dizer: concursado!) do Tribunal Regional do Trabalho de Pernambuco (TRT-PE), com mais de 12 (doze) anos de serviços prestados a essa instituição. Integrei a chapa eleita na última eleição para o sindicato da categoria (Sintrajuf - Sindicato dos Trabalhadores no Judiciário Federal em Pernambuco). Mas escrevo na condição de cidadão, não exatamente na condição de sindicalista ou de trabalhador do serviço público.


Como trabalhador, tenho participado de discussões - já antigas - no âmbito do Sindicato e da Federação (Fenajufe - Federação Nacional dos Trabalhadores no Judiciário Federal) de intenso combate contra as manobras legislativas que tentam burlar a exigência de concurso público para investidura em cargo público efetivo.


Nosso combate é de primeira-hora: desde que se propôs no Congresso coisas do gênero da PEC 02/2003 (Proposta de Emenda Constitucional), os sindicatos e federações - sem exceção - têm-se manifestado francamente contrários a tal iniciativa. Todas as ações sindicais, quer junto à base, quer junto aos parlamentares, buscam a rejeição da proposta.


Registraram-se uns poucos casos de "revolta" por parte daqueles que seriam beneficiados pela proposta, com tentativas de intimidação e ameaças veladas, tanto a dirigentes sindicais quanto a outros trabalhadores da base da categoria, mas nada realmente digno de nota.


Sabe-se que há distorções no serviço público, em face da carência de servidores. É por absoluta falta de compromisso dos diversos governos que ocorrem requisições de servidores de outros órgãos para suprir a demanda de trabalho. Em vez de resolverem adequada e definitivamente o problema, com a realização de concurso público, valem-se os administradores ora do instituto da requisição, ora da terceirização.


Tais artifícios, em boa parte das vezes, deixam de atender ao interesse público. Agraciando alguns, burlam a exigência de ingresso por concurso. Por outro lado, os supostos beneficiários tornam-se reféns desses favores, criando vínculos de difícil (ou impossível) controle institucional. É preciso ressaltar que vários dos males semelhantes têm de ser combatidos, tendo-se em mente que o combate não é contra a pessoa de nenhum requisitado, de nenhum terceirizado, mas em defesa da sociedade como um todo. Pois esses institutos vêm afrontando os princípios constitucionais da legalidade e da moralidade na administração pública, além da isonomia de tratamento aos cidadãos brasileiros. Isonomia esta que exige que qualquer vaga no serviço público seja preenchida garantindo-se igual oportunidade a todos os que a ela se candidatem, respeitados os requisitos legais.


É o interesse público que tem de prevalecer: se os requisitados e terceirizados realmente querem garantir seus direitos, que o façam por meio do devido processo legal, que é o concurso público de provas ou de provas e títulos. Na relação altamente questionável que os mantém em cargos para os quais não prestaram concurso, os assalariados são o elo mais fraco. Eles precisam ter o cuidado de não servir a interesses escusos, inconfessáveis, daqueles que se encontram ávidos pela reabertura das janelas legais (por definição, imorais).


Por tais janelas, em outros tempos, os donos do poder inchavam o serviço público de apaniguados, desprofissionalizando-o e tornando-o verdadeiro cabide. São dessa época os extintos institutos da hereditariedade do cargo, da ascensão funcional (exigência de concurso apenas para a primeira investidura) e outros tantos que foram banidos pela exigência da sociedade e com resposta efetiva das mais altas cortes julgadoras.


A sociedade brasileira precisa reafirmar que tal tempo é passado, mantendo o combate a essas e outras mazelas. Esse combate tem de ser contínuo, dentre eles contra o nepotismo. Este é outro mal, também amplamente combatido pelos sindicatos de servidores públicos que também nisso têm sido injustiçados nas notícias lidas, vistas e ouvidas por meio da imprensa.


Terceirização, requisição e nepotismo são três males que afligem o serviço público. Todos bastante combatidos pelas entidades de trabalhadores, há muito. Imputar omissão, neste momento, é injusto. O combate não é somente necessário, mas já vem sendo travado da maneira mais veemente possível e de longa data.


* Denilson Laranjeira é Funcionário Público Federal, Mestre em Física, Acadêmico de Direito, Sindicalista, "a besta fubana" e "o Cão do Sétimo Livro".

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

AVISO AOS NAVEGANTES...


A SEGUIR, UM ENSAIO ANALÍTICO SOBRE AS PRINCIPAIS GREVES DOS SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS EM PERNAMBUCO, OCORRIDAS DURANTE O MÊS DE JULHO/2007.


NA TENTATIVA DE FACILITAR A LEITURA, DIVIDI O ENSAIO EM 4 ARTIGOS DISTINTOS, QUE SE SEGUEM EM SEQÜÊNCIA ORIGINAL AO TRECHO DO ENSAIO AQUI REPRODUZIDO.


DO TEXTO ORIGINAL EU NÃO PUBIQUEI AQUI A ANÁLISE SOBRE "OS MOVIMENTOS OPORTUNISTAS", ISTO É, O DAQUELAS CATEGORIAS QUE SE APROVEITARAM DOS MOVIMENTOS PRINCIPAIS (PROFESSORES E MÉDICOS) PARA "CHATAGEAREM" O GOVERNO DO ESTADO, VISTO QUE, POR SI MESMOS NÃO APRESENTAVAM FORÇA NEM MOBILIZAÇÃO PARA ENFRENTAREM O GOVERNO (TAIS COMO POLICIAIS CIVIS E MILITARES, DETRAN E SAÚDE - NÍVEL MÉDIO E FUNDAMENTAL). O FATO DE NÃO HAVER PUBLICADO, SE DEVE APENAS AO MEU INTERESSE DE PUBLICAR NESTE BLOG UMA ANÁLISE QUE APRESENTASSE OS NOVOS ELEMENTOS SOCIAIS E POLÍTICOS QUE FORAM OBSERVADOS DURANTE OS PROTESTOS E REIVINDICAÇÕES. DESTE MODO, CONSIDERANDO QUE "APROVEITAR-SE DA FORÇA DO MOVIMENTO ALHEIO PARA TIRAR PROVEITO PRÓPRIO" NÃO É UMA ESTRATÉGIA NOVA, NEM TÃO POUCO CRIATIVA, ACHEI POR BEM NÃO TRANSCREVER PARA CÁ MINHAS OBSERVAÇÕES E REGISTROS SOBRE "OS MOVIMENTOS OPORTUNISTAS".


OUTROSSIM, O TEXTO COMPLETO PODE SER SOLICITADO ATRAVÉS DO E-MAIL brenorocha@hotmail.com SERÁ DISPONIBILIZADO, TAMBÉM, EM MAIORES QUANTIDADES (IMPRESSAS) PARA SINDICATOS, ASSOCIAÇÕES, ONGS, BIBLIOTECAS, ETC., DESDE QUE SOLICITADO COM ATENCEDÊNCIA.


AS LUTAS DE JULHO


O mês de Julho caracterizou-se pelo franco enfrentamento entre os Servidores Públicos Estaduais e o Governo Eduardo Campos. Em apenas sete meses de administração Eduardo conseguiu dispersar sua principal base de apoio político popular: os Servidores Públicos que, confrangidos pela manutenção, por parte de Eduardo, da “despolítica” de pessoal iniciada ainda na tirânica gestão de Jarbas Vasconcelos, venceram o represamento político arquitetado pelas suas Direções Sindicais e, em todos os casos, impuseram a primeira derrota administrativa à Eduardo e sua equipe.

As greves e mobilizações dos Servidores Públicos, entre outros aspectos, apresentaram uma nítida tendência de independência política entre as Categorias e o Governo, mas, também, uma bem definida tendência de independência entre as Categorias e suas respectivas Direções Sindicais. E estas demonstrações foram de suma importância para, no primeiro caso, apresentar ao conjunto do governo pernambucano (isto quer dizer, aos ocupantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) que não há, em Pernambuco, pelo menos ao que se refira aos Servidores Públicos, uma massa uniforme para manobra governamental: não há, como sugeria alguns importantes membros da equipe de Eduardo, uma dicotomia entre “estar com Eduardo, ou com o PFL (DEM, ou como quer que se autodenomine a direita oligárquica pernambucana). Os Servidores Públicos, conforme demonstraram, estão “do seu próprio lado”, ou seja, do lado histórico (dialético) do TRABALHO – força social transformadora, produtora da História e motor da evolução social da humanidade. No que se refere ao segundo caso, os Servidores Públicos estaduais demonstraram aos seus respectivos dirigentes sindicais (e a população em geral) que não são “massa-de-manobra” nem das direções sindicais, nem dos políticos que se autodenominam seus representantes e, mesmo na contra-mão dos interesses específicos desses, as “bases”, de maneira geral, impuseram os seus próprios e legítimos interesses às direções atônitas e aos políticos apalermados.

O que se pôde deduzir como resultado da luta política dos Servidores Públicos foi, inequivocamente, a derrota do modelo de gestão pública testado pelo Governo Eduardo, em apenas sete meses. Isto porque, com a vitoriosa campanha dos Servidores Públicos a “idéia” governamental da “mesa única de negociação” escorreu pelo ralo, na medida em que o Governo foi obrigado, não apenas a negociar separadamente com as Categorias que mais se demonstraram dispostas ao embate político (greve, no caso dos Professores e Demissões, no caso dos médicos), mas, também de praticar índices de reajuste salarial diferenciado de acordo com o poder de mobilização de cada categoria e o impacto social de cada movimento em particular.

Três aspectos particulares do conjunto de fatos ocorridos durante as mobilizações dos Servidores Públicos, no entanto, são de imprescindível destaque para a nossa presente avaliação: a) a indiferença dos Professores à Decisão Judicial que decretou a ilegalidade do seu movimento paredista; b) o inusitado movimento demissionário do Médicos e; c) o comportamento parcial da Imprensa pernambucana.

Os Professores e sua determinação irreversível:


Estivemos presentes à primeira reunião geral dos Sindicatos pernambucanos com a Secretaria de Administração e, além da idéia do Governo em criar uma “mesa geral de negociação”, na qual todas as pautas gerais dos sindicatos dos servidores públicos (leia-se, REAJUSTE SALARIAL) fossem discutidas conjuntamente (o que, penso eu, seria uma excelente forma de unificação das lutas dos Servidores Públicos patrocinada pelo próprio Governo, “se, e somente se” – como dizem os matemáticos – não houvesse o óbvio corporativismo, muito mais característico das categorias com maior poder de mobilização e impacto social.), além da idéia do Governo em criar uma “mesa geral de negociação”, dizia eu, o inusitado na referida reunião foram as declarações sucessivas dos sindicalistas presentes, com as quais pronunciavam seus apoios e “esperanças” no Governo Eduardo, do qual, segundo seus próprios depoimentos, se declaravam eleitores (!).

Foi um (para mim e outros poucos presentes) constrangedor ato público de apoio sindical (institucional, oficial) ao Governo que se iniciava... Isto ocorreu em Março... Três meses depois, em Junho, portanto, os Professores, ao decretarem GREVE demonstraram claramente que havia uma distorção entre os interesses particulares da sua Direção Sindical e os interesses imediatos do conjunto da Categoria.


Publicamente contra a vontade da Direção, os Professores e Professoras da rede Estadual apropriaram-se de um discurso legalista burguês – o da garantia do vencimento não inferior ao Salário Mínimo Nacional – e mantiveram por mais de 50 dias a paralisação, sempre após Assembléias onde não faltaram vaias aos Dirigentes e aos Políticos “de esquerda” que se atreviam a defender a questionável posição do Governo Estadual.

Porém, o fato mais determinante de todos, no caso dos Professores, foi a ignorância (verbete aqui utilizado no sentido etimológico inicial da palavra, ou seja; “estado de quem ignora ou desconhece alguma coisa”; conforme Aurélio Buarque) com a qual a Categoria tratou a decisão judicial que decretou a ilegalidade do seu movimento paredista. Ignorar uma decisão judicial nestes moldes não é de todo inédito em nosso Estado. No ano passado, os Agentes Penitenciários fizeram a mesma coisa quando da decretação da ilegalidade do seu próprio movimento reivindicatório; e antes destes, os Policiais Militares, ainda em meados dos anos 90 do Século passado. Ocorre que, como já demonstramos em outra oportunidade, há uma “fraqueza” na lógica interna de tais decisões judiciais; esta se dá porque, como quem decreta a GREVE é a instituição SINDICATO e não as personalidades físicas de cada trabalhador singularmente, a imposição judicial se dá à instituição, portanto, ao sindicato e não aos seus representados, isto é, à Categoria. Desta feita, não é possível, também, a coação de uma instituição, a não ser de maneira econômica (financeira), através da imposição de altíssimas multas, sempre e sempre impagáveis, dado ao valor impetrado. (No caso dos Agentes Penitenciários, por exemplo, RISÍVEIS – pela obviedade da incapacidade total de recursos para o pagamento – R$ 500.000,00 / DIA; isto mesmo, QUINHENTOS MIL REAIS, POR DIA QUE O MOVIMENTO SE PROLONGASSE).


Conforme já fora analisado anteriormente por nós, nesses casos, o Sindicato pode, por exemplo, deixar-se sucumbir institucionalmente numa dívida impagável e, em troca, manter o movimento vivo, pois, enfrentar a lógica capitalista é o primeiro papel de qualquer instituição que se arvore em denominar-se SINDICATO. Uma instituição que, ao longo da história, enfrentou os mais truculentos tiranos não irá fenecer frente a pressões meramente economicistas... (acredito eu).


Mas, no caso dos Professores, havia uma variável: ocorre que quando a medida judicial pressiona financeiramente a instituição sindical, o faz para que esta (o sindicato) pressione, por sua vez, os seus associados (a categoria). Deste modo, tais sentenças judiciais nada mais são do que “chantagens” que funcionam a partir da seguinte lógica: “se a direção não utilizar sua influência para fazer a Categoria voltar ao trabalho, sucumbirá sem recursos financeiros”. Ocorre que, conforme discorremos anteriormente, existem “direções” que não funcionam exclusivamente a partir dos recursos financeiros da instituição (sindicato): estas nunca estarão suscetíveis a tal chantagem. Em outros casos, como parece ter sido o dos Professores, havia uma espécie de “litígio” entre a Categoria e a Direção do Sindicato. Tal “litígio”, porém, não se dava na esfera da legitimidade, mas, da orientação política. Ou seja, não houve, em nenhum momento, qualquer contestação acerca da legitimidade da Diretoria e, por isso mesmo, nenhuma sugestão, mesmo que sutil, sobre sua substituição. Entretanto, havia um indissimulável questionamento quanto à orientação política emanada pela Direção Sindical. Em dado momento setores da Categoria (setores com legitimidade forjada na luta, para tal) chegaram a questionar o interesse imediato da orientação política da Direção Sindical; se esta visava o interesse da Categoria ou do Governo (se tomava partido do Trabalho ou do Capital). Tal questionamento, fundamentado na postura sempre vacilante da Direção Sindical, fora determinante para que a Categoria entendesse que quem estava ameaçado pela determinação judicial era a Direção e não a Categoria. E se a Direção se comportava como quem defendia o interesse do Governo e não dos Trabalhadores, o primeiro era quem tinha a perder com a execução da sentença, não os segundos. Esta reflexão fora, ao que parece, o principal motivo para que os Professores, arrimados em outros tantos argumentos jurídicos (recursos judiciais, que a decisão era, ainda, interlocutória, etc.), ignorassem a aludida decisão judicial e mantivessem ativo seu movimento paredista.

Mesmo que seja reconhecida essa especificidade da GREVE dos Professores, a qual determinou a ignorância desses quanto a decisão judicial em questão, o fato é que o desprezo dos Professores para com o artifício jurídico do Governo de, sempre que possível, buscar a decretação judicial da ilegalidade das GREVES se demonstrou num importante passo para a cristalização dessa nova cultura; o que necessariamente fará, ao compasso de sua mais freqüente repetição, que, no futuro, os tribunais, invariavelmente a serviço do Capital, busquem outra forma de chantagear os trabalhadores e suas Entidades Representativas... (Vide, por favor, neste momento da Leitura, “Hino de Duran, de Chico Buarque de Holanda, e se possível o escute : “porque a arte é [sempre] mais ontológica que a razão”).



Hino de Duran Chico Buarque/1979
Para a versão paulista da peça Ópera do Malandro, de Chico Buarque


Se tu falas muitas palavras sutis
E gostas de senhas, sussurros, ardis
A lei tem ouvidos pra te delatar
Nas pedras do teu próprio lar


Se trazes no bolso a contravenção
Muambas, baganas e nem um tostão
A lei te vigia, bandido infeliz
Com seus olhos de raio-x


Se vives nas sombras, freqüentas porões
Se tramas assaltos ou revoluções
A lei te procura amanhã de manhã
Com seu faro de dobermann

E se definitivamente a sociedade só te tem
Desprezo e horror
E mesmo nas galeras és nocivo
És um estorvo, és um tumor
A lei fecha o livro, te pregam na cruz
Depois chamam os urubus

Se pensas que burlas as normas penais
Insuflas, agitas e gritas demais
A lei logo vai te abraçar, infrator
Com seus braços de estivador

Se pensas que pensas (...)

O inusitado movimento dos Médicos pernambucanos.



Há tempos que vimos preocupados com o desenvolvimento (ou, a necessidade do desenvolvimento) de novas formas de lutas para o Trabalho, em seu histórico enfrentamento com o Capital.

Certos que estamos de que as formas de luta tradicionais dos trabalhadores vêm se estagnando frente ao desenvolvimento das reações sociais, política, bélicas e jurídicas do Capital (e seus representantes), somos, talvez, os principais entusiastas do desenvolvimento de novas formas de enfrentamento do Trabalho para com o Capital. Por isso mesmo, não apenas vimos tentando elaborar um raciocínio (uma reflexão) que se fundamente na observação minuciosa da dialética entre a Lógica do Trabalho e a Lógica do Capital, mas, temos investido todo o possível na pesquisa, catalogação e análise dessas novas formas de luta a quais assistimos se desenharem (em verdade, se esboçarem, visto que essas ainda parecem despontar em suas formas embrionárias).

A partir dessas nossas observações já é possível declarar o seguinte:

Algumas formas tradicionais de opressão do Capital sobre o Trabalho já se demonstram completamente inócuas (do ponto de vista prático). Podemos citar, por exemplo, além das decisões judiciais de ilegalidade dos movimentos paredistas (conforme análise no tópico anterior), o CORTE DE PONTO.

A tática de descontar previamente (isto é, antes do desfecho final das negociações, onde, esta e outras ações repressivas são sempre rediscutidas) os valores referentes aos dias sem a prestação de serviço, devido às atividades paredistas da Categoria era, efetivamente, uma tática eficiente num outro cenário político e social, mais diretamente relacionado ao trabalho fabril e à “sociedade industrial”.

Ocorre que num modelo de “sociedade industrial” (que vem sendo superado historicamente), relativo aos Séculos XVIII, XIX e parte do Século XX, o trabalhador estava atrelado a apenas um emprego”, o da fábrica, no qual ele dispensava todo o seu dia útil e, do qual, recebia a totalidade dos seus proventos; com os quais passou exclusivamente a garantir o sustento de sua família (considerando-se os anos, as décadas e os Séculos que se passaram para que se atingisse tal estabilidade; isto é, a análise em questão está mais diretamente relacionada à fase de pleno desenvolvimento da “sociedade industrial” a partir do seu modelo “fordista” de organização, no qual, finalmente, as crianças são afastadas do trabalho, a fim de que se prestigiasse sua formação educacional voltada para “o trabalhador do futuro” e as mulheres tratavam da estabilidade doméstica; da estabilidade familiar).

Este trabalhador subsistia exclusivamente do salário pago pela fábrica, reitero. Logo, para este trabalhador, o corte do ponto era uma “coação irresistível”, pois, representava a FOME para si e para a sua família, no final do mês... imediatamente. Tal coação não possui a “força” (o impacto) hoje, que possuía àquela época: primeiro porque o sustento a subsistência da família não depende mais exclusivamente do “marido” (pai, trabalhador) – ou seria melhor dizer: o sustento da família depende cada vez menos exclusivamente do “marido” (pai, trabalhador”). Aos poucos, mas, de maneira continuada, o “sistema” foi empurrando a mulher de volta ao Mercado de Trabalho. Sob a influência do discurso ideológico da “igualdade” entre os gêneros e da “emancipação” feminina, as mulheres foram recolocadas aos postos de trabalho, onde reforçaram o “exército de reserva de mão-de-obra”, pressionando para baixo os valores dos salários nos setores da economia onde a “tecnologia” ainda não executa tal tarefa. De outro modo, porém, aos poucos, mas também de maneira continuada, a divisão do sustento familiar entre “marido” e “esposa” foi permitindo a maior independência de cada um com relação ao seu trabalho respectivo. Ou seja, se, num primeiro momento, o ingresso da mulher no Mercado de Trabalho determinou, a partir do aumento da concorrência por postos de trabalho, a redução da oferta da remuneração pelo trabalho prestado; num segundo momento, provocou, para as famílias, maior capacidade de resistência às pressões do “sistema”, tais como: desemprego, achatamento salarial, ofertas de sub-postos de trabalho, cortes de pontos, etc. Hoje, se o “marido” (conforme o caso que estamos discorrendo) tem o “Ponto Cortado”, por mais pressões que, muitas vezes, a própria mulher se encarrega de exercer sobre ele, substituindo ou amplificando eventualmente a própria pressão patronal, o "corte de ponto" não significa a materialização da fome para si ou para sua família, imediatamente no final do mês, uma vez que ele poderá contar com o socorro financeiro da esposa.
Em segundo lugar, o impacto do "corte de pontos" não é mais o mesmo graças, também, ao desenvolvimento do Capitalismo Financeiro. "Adversário" histórico que é do Capitalismo Industrial (principalmente pela prioridade que aquele destina ao capital; qual seja, a especulação financeira e não o investimento na produção), o Capitalismo Financeiro desenvolveu o atual sistema de crédito. Através deste, o trabalhador pode, caso efetue uma programação estratégica, suportar dois ou três meses de "corte de ponto". Caso, inclusive, saiba combinar o "sistema de créditos" com o auxílio da "esposa", a resistência ao "corte de ponto" poderá ser até mais prolongada...
Mas, na atual circunstância das "lutas de julho", um terceiro fator aponta para a falência histórica da estratégia patronal do "corte de pontos": a diversidade de postos de trabalho, específica nas categorias envolvidas no embate.
Ocorre que Categorias como Professores, Médicos e Policiais (estes último de maneira especial) prestam serviços sempre a mais de um empregador ao mesmo tempo; ou seja, estes profissionais compõem suas rendas a partir do acréscimo de dois ou mais postos de trabalho (os policiais são citados acima como "de maneira especial" visto que, no seu caso, este outro posto de trabalho, apesar de cada vez mais estar se configurando em regra, ainda é ocupado de forma "clandestina"). Logo, fica claro que o impacto do "corte de ponto" para as referidas Categorias Profissionais (além de outras aqui não referidas) não tem a eficiência esperada pelo empregador. E, ainda, se tal medida impõe, de fato, alguma pressão sobre os referidos trabalhadores, tal pressão está cada vez mais relacionada à uma forma "ideológica" (exercida principalmente a partir do efeito de uma espécie de "memória coletiva" sobre as drásticas conseqüências que o "corte de ponto" impunha antigamente) que exatamente aos seus efeitos práticos contemporâneos.
Porém, no caso particular dos Médicos pernambucanos, a estratégia de luta conseguiu ir ainda mais além... Não tratou-se, apenas, da confirmação das novas condições sociais e econômicas que, finalmente, passaram a ser decodificadas pelo Trabalho e, a partir disso, utilizadas como instrumento de pressão deste, contra o Capital; mas, da verdadeira inovação da estratégia de luta!

Beneficiados diretamente pelo recrudescimento dos postos de trabalho para a Categoria, dado o desenvolvimento do pólo médico no Estado, os Médicos "simplesmente" PEDIRAM DEMISSÃO!
Tal estratégia desnorteou completamente o Governo do Estado, o qual, evidente mente, não estava preparado para uma ação nestes termos.
A estratégia de pedir demissão coletivamente não foi, exatamente, inédita. Mas, foi a primeira vez que se efetivou. Em outros movimentos, principalmente durante o Governo Jarbas, os Médicos pernambucanos se valeram do discurso de que pediriam demissão, sempre como forma de "chantagem" sindical. Jarbas, entretanto, nunca foi arrogante o suficiente para "pagar para ver". Eduardo, por sua vez, foi, não apenas arrogante, mas, incompetente o bastante para arrastar, a partir da falta de diálogo oriundo de avaliações equivocadas da sua equipe, o segmento da saúde pública para a pior crise já ocorrida no Estado.
Até então, esperava-se que os Médicos não levassem à cabo suas ameaças... as esperanças foram, porém, vãs...
Com os pedidos de demissão, os médicos colocaram "em cheque", de uma só vez: a política administrativa do Governo, que, até então era de não negociar com nenhuma categoria em separado; o Poder Judiciário, visto que não havia precedente jurídico para remediar o impasse, uma vez que, a regras trabalhistas em vigor no país não prevêem, ainda, a imposição coercitiva ao trabalho (exceto para o preso, que, por força da Lei de Execução Penal é OBRIGADO a trabalhar) e, finalmente, a "todos aqueles" que são sempre "contra as greves", os quais detinham invariavelmente o seguinte discurso: "não quer trabalhar, peça demissão, mas não atrapalhe fazendo greve". Os Médicos pediram demissão e demonstraram que a dialética aristotélica do "escravo e senhor" (atualizada, posteriormente, por Hegel) ainda está completamente em vigor; ou seja, a interdependência entre trabalhador e patrão é irremediavelmente efetiva; e, enquanto a cibernética não conseguir equacionar tal interdependência, patrão dependerá muito mais do trabalhador do que o inverso...

A Imprensa pernambucana e sua “vocação” à “direita”.


O último aspecto relevante a ser especialmente analisado acerca das “lutas de julho”, diz respeito ao papel “estratégico” que assumiu a cobertura da Imprensa pernambucana sobre os movimentos reivindicatórios dos servidores públicos.

De um modo geral e sem que sejam registradas quaisquer alterações dignas de destaque, a cobertura dos jornalistas pernambucanos se configurou de duas maneiras distintas: uma; induzindo o Governo de que há uma “pressão popular” fundamentada nas diversas “promessas de campanha” do candidato Eduardo Campos, as quais, por não serem cumpridas pelo então Governador Eduardo Campos legitimavam as mobilizações dos servidores e garantiam, também, o apoio popular a estas. A outra, quando do recrudescimento dos movimentos em questão, assumindo um caráter eminentemente censor dos movimentos, os quais, segundo a tendência geral dos editorias locais, “prejudicavam apenas os mais penalizados pelos problemas estruturais” tanto da saúde como da educação, ou seja: O POVO.

De uma forma ou da outra, ficava evidente a tendência “direitista” da imprensa local, uma vez que, no primeiro perfil demonstrado, ou seja, quando a Imprensa induz o Governo de que há uma “pressão popular” admitindo a hipótese da legitimidade dos movimentos paredistas, não nas graves condições de trabalho e de recursos humanos vivenciadas pelos segmentos profissionais em mobilização, mas, no descumprimento das “promessas de campanha”, tal postura indica, subliminarmente, a perspectiva da “punição” do Governo (e, por conseguinte, do Governador) por haver elaborado um programa de governo “à esquerda”, ou “popular”. Isto é, age a Imprensa como uma espécie de “oráculo balizador” à “direita”, o qual decreta com todas a letras: “estás pagando por ter apresentado um programa de avanços sociais e políticos incompatível com a lógica administrativa neoliberal. Ao prometeres avanços, criaste um clima de expectativa por suas materializações: agora, pagas por ter instigado o povo ao desejo da solução dos problemas”. Ora, mas esta é, talvez, a mais agressiva postura de “direita”, uma vez que “sugere” que programas de “esquerda” não sejam sequer apresentados, sob pena de “despertarem do sono letárgico neoliberalista” o povo; os trabalhadores; os sindicatos...

Mas, foi o segundo perfil, o que expôs uma Imprensa, não apenas de “Direita”, mas, também CÍNICA.

Com manchetes do tipo: “Justiça determina volta imediata ao serviço”, sobre a determinação judicial, à época ainda interlocutória, contra a greve dos professores, os jornalistas locais alinhavavam toda sorte de argumentos falaciosos, os quais buscavam fundamentos no “sofrer do povo” para legitimar a derrocada do movimento; como se tal sofrer fosse produto das greves e não da gestão pública... Como se a Pauta de Reivindicação dos referidos movimentos não visasse, justamente, a erradicação de tal sofrer... Como se os trabalhadores reivindicantes não fosse, também, “povo sofredor”... e, finalmente, tentando inverter o sentido do embate que se travava: de Trabalhadores X Governo para Povo X Trabalhadores.

Não parece haver, porém, uma articulação institucional que determine tal comportamento. Ou seja, as posturas impressas pelos jornalistas em seus artigos/matérias não parecem serem fruto de qualquer determinação patronal ou governamental (em nenhum dos casos apresentados acima), antes, o produto da maior invenção metafísica comprovadamente arquitetada pelo homem: a ideologia (aqui referida no sentido marxista do termo: “falsa consciência”).

A partir dos efeitos da ideologia, todos nós somos levados a assumirmos os valores da classe dominante como se fossem nossos, ou mesmo, como se nos beneficiássemos da manutenção destes. Este fenômeno faz com que, conforme o presente caso, jornalistas, os quais, em Pernambuco, a quase uma década não efetuam qualquer movimento reivindicativo, que, por conta disso, perderam conquistas históricas como por exemplo, piso salarial; este mesmos jornalistas que só se interessam em focalizar a desestrutura dos serviços públicos em situações de caos; estes jornalistas se arvoraram em evocar o nome do povo para esboçar toda a sorte de crítica aos movimentos reivindicativos, prestando, com isso, um excelente serviço ao Governo, conforme observamos.