sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Segurança Pública e Conflito de Gerações


["Aviso aos navegantes: o texto asseguir não é INÉDITO. Foi publicado no bolg de Jamildo (JC On Line) em março deste ano. Recuperei-o e achei que devia postá-lo aqui; inclusive porque vejo nele uma conexão com o artigo da 'antiestética' que postei logo mais abaixo.]

"O conflito entre gerações sempre esteve presente em todas as sociedades, faz parte do processo histórico e trabalha como uma ferramenta de amadurecimento": esta e uma definição que bem pode ser encontrada em diversos compêndios sociológicos e, de fato, o Conflito de Gerações foi determinante para o avanço social, político e econômico de grandes sociedades.

Só para exemplificar, podemos relembrar o movimento dos jovens operários franceses na década de 60 do século passado ou o movimento Hippie nos Estados Unidos da América do Norte, nos anos 70 do mesmo século.

No primeiro caso, estava em jogo a defesa do ensino público em Sorbone, o enfrentamento contra a exclusão do jovem da esfera de decisão política e a exploração aviltante da mão-de-obra do jovem trabalhador francês, que se via explorado em prol da manutenção do "status quo" dos "seniores".

Já no que se refere aos Hippies, estes, aos auspícios da palavra de ordem "Faça amor, não faça guerra" se recusaram a ir morrer no Vietnã e, ao som de guitarras destorcidas, movidos a ácido lisérgico e embalados pelo "amor livre", cavaram uma importante trincheira de combate à política beligerante do regime norte-americano quase que dentro do quintal da Casa Branca.

Mas, qual a relação entre os conflitos de gerações citados e a estapafúrdia crise na nossa segurança pública? Tudo, atônito leitor, tudo mesmo...

Observe que em ambos os casos acima os jovens, vitimados pelas equivocadas, mesquinhas, estúpidas ou simplesmente incompetentes decisões políticas dos Seniores responsáveis pela condução política, econômica e social dos respectivos países, foram às ruas, ocuparam os devidos espaços e, quer pregando "paz e amor", quer bradando palavras de ordem, impuseram a alteração das políticas adotadas, as quais, vitimavam quase que exclusivamente a juventude.

Agora, observe como está organizado o "status" político-administrativo da nossa sociedade... Bom, se me permitir, vou ajudá-lo... Por motivos "didáticos" (e também para não tangenciarmos o assunto) vamos nos focar no sistema de segurança pública (também denominado mais recentemente como Sistema de Defesa Social).

Nossa segurança Pública esta sendo dirigida, historicamente, pelos "Seniores".

E isto funciona da seguinte maneira; o cidadão é Coronel da PM, ou Delegado de Polícia Civil, o que significa que, de uma maneira ou de outra (por atos, ou omissões) coordena, dirige, executa, colabora, sugere, a política de segurança pública do Estado durante toda a sua vida profissional.

No caso dos PMs, em especial, eles ingressam na tropa ainda muito jovens e vão envelhecendo sempre em postos de comando, sugerindo, desenvolvendo e executando as ações policiais ostensivas no Estado, por sua vez, os Delegados, ingressam na carreira após concluírem o curso de Direito, isto é, já "formados" para o trato com o fazer legal.

Após trinta, trinta e cinco ou, às vezes, quarenta anos de serviço se espera que esses Seniores tenham se tornado, de uma forma ou de outra, "experts" em segurança pública. Que eles tenham aprendido tanto com seus erros e acertos que sejam capazes de, finalmente, sugerir o caminho "menos tortuoso" a ser seguido pela sociedade... afinal, é este o papel histórico dos Seniores.

Mas, e quando eles não o conseguem? Geralmente os jovens se transformam na principal vítima de seus "equívocos", até não suportarem mais e rebelarem-se, quer armando barricadas nas ruas, quer dançando nus perto do fogo... iniciando um conflito de gerações.

Voltemos ao caso em particular: o da nossa cruenta crise na segurança pública (desculpem, reconheço que "cruento", depois de dois finais de semana que contabilizaram juntos mais de 100 cadáveres, não parece um adjetivo sutil nem tem o efeito de eufemismo que tentei provocar).

Qual o legado dos nossos Seniores para com segurança pública do nosso Estado?

O caos!(?) Trinta, trinta e cinco anos de serviços nos quartéis e nas delegacias e o que construíram para nós: a carnificina com a qual temos sidos obrigados a conviver? A degeneração de qualquer sopro de dignidade humana por trás dos muros do Aníbal Bruno, sob os auspícios da nossa indiferença? Ou o abate sistematicamente covarde de nossas mulheres?

De certa maneira, os pernambucanos parecem ter compreendido este problema sociológico que ora abordo.

Essa necessidade da promoção de um conflito de gerações, mesmo que tardio, a fim de resgatar um fio de esperança na produção de uma saída viável e arrojada para o problema. Pode ser um indício de tal compreensão que a disputa ao posto de Governador do Estado, nas últimas eleições, se deu, definitivamente, entre dois candidatos jovens.

Esperava-se que com um jovem conduzindo os rumos da política administrativa estadual ações dinâmicas, arrojadas e inovadoras fossem desenvolvidas visando à erradicação – ou mesmo o enfrentamento eficiente – do problema.

E ao invés disso, o Governador Eduardo Campos vem optando em reconduzir ao poder "ex-coronéis", "ex-delegados", "ex-perts" que não aceitam de maneira alguma o "título" de "ex-poderosos".

Autoridades que não satisfeitas em ter "contribuído com sua parte para esse nosso belo quadro social" (para lembrar Raul Seixas, que tem tudo a ver com hippies e conflitos de gerações), acreditam que agora, depois de trinta anos construindo ESSE modelo de segurança pública, podem ainda "refiná-lo", "aperfeiçoá-lo", "sofisticá-lo" em proporções inimagináveis...

E os nossos jovens?

Continuam sem emprego, sem formação profissional garantida pelo Estado, sendo caçados e abatidos pelos grupos de extermínio e sem nenhuma disposição de luta.

Quer dizer, em alguns casos, só encontram disposição para lutarem entre si, digladiando pelo título de torcida mais burra, ou desempregado mais inútil. A "passos marcados", cada dia vemos mais distante a possibilidade de termos o nosso "Conflito de Gerações" e entristecemos ao perceber que talvez nos reste apenas "invejar" os jovens operários franceses ou festejar os Hippies norte-americanos...

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