quarta-feira, 26 de março de 2008

A PROPRIEDADE NO BANCO DOS RÉUS.

Iniciou, ontem à tarde, o que tem sido qualificado pela Imprensa local de “o maior julgamento da história do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco”. Ao longo desta semana a justiça pernambucana deve julgar 15 réus, sendo eles 5 Policiais Militares e 10 Vigilantes, os quais estão sendo acusados do homicídio do Trabalhador Rural Luiz Carlos da Silva e das lesões corporais de mais 13 vítimas.

Os crimes, conforme denúncia do Ministério Público divulgada através da Imprensa, ocorreram no ano de 1999, quando da greve dos canavieiros: as vítimas seriam sindicalistas que, em visita sindical, buscavam a adesão dos trabalhadores da Usina Santa Teresa ao movimento paredista. A comissão sindical foi, entretanto, recebida à bala; o que culminou nos crimes acima mencionados.

“O maior julgamento de Pernambuco” expõe uma das mais cruéis faces da disputa em torno da propriedade. Se observarmos os “detalhes” que permeiam os fatos em questão, veremos que o proprietário, no nosso sistema, consegue, aos auspícios da lei, safar-se das disputas inevitáveis para a manutenção de sua propriedade, evitando, desta forma, ser responsabilizado pelas conseqüências, físicas ou jurídicas, de tais disputas.

Luiz Carlos da Silva, que não tinha nenhuma propriedade, mas, que tentava organizar a força de produção visando angariar maior valor pela venda da mão-de-obra – e, consequentemente, conseguir algum excedente financeiro para, quem sabe, adquirir propriedades – perdeu a VIDA. Os 15 réus, que também não detém a propriedade da Usina Santa Teresa, correm o risco de perderem a LIBERDADE... e, assim, VIDA e LIBERDADE, que são classicamente consagrados como “bens maiores”, se esvaem em função da propriedade... alheia.

É característico como, na luta acerca da propriedade, apenas um lado é vitimado: o dos desapossados.

O julgamento em questão, entretanto, se apresenta como emblemático para o momento social que atravessa o país e, em certa medida, o mundo contemporâneo. Em outras épocas, a morte e as lesões dos sindicalistas seriam “pacificamente” atenuadas pelo escudo da “invasão de propriedade”. Outrossim, ao levar o caso para Júri Popular, o Ministério Público permitiu à sociedade – representada através dos jurados – o mister de decidir se, no nosso tempo, a VIDA está acima da propriedade ou se a propriedade ainda vale mais que a vida. Isto faz com que devamos ter atenção redobrada à sentença a ser prolatada ao fim do julgamento. Mais do que “justiça” (e “só” isto já seria, em si, digno de atenção) a sentença poderá ser um indicador de uma lenta, gradual, mas, definitiva tendência de mobilidade social, que por emergir do povo – representado genuinamente pelos jurados – além de traduzir uma legitimidade incontestável, indicará, possivelmente, uma tendência irreversível.

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