quarta-feira, 30 de maio de 2007

Chaves, a liberdade de Imprensa e a Democracia.


Tem assuntos que não me deixam dormir... digo, LITERALMENTE!

Já estava recolhido quando comecei a pensar na adoção da medida de Hugo Chaves, de não renovar a concessão da RCTV. Vi algumas imagens dos protestos na Venezuela, contra a medida...

Muitíssimo por acaso estou lendo um livro que trata do tema: “Liberdade de Imprensa”, MARX, Karl. L&M Pocket. 1999, 196 pág.

Comecei a ler esse livro há duas semanas, pois estou pensando em escrever algo sobre a Imprensa Sindical. De repente percebi que a Imprensa Sindical vem, paulatinamente, se transformando numa “outra” Imprensa Oficial (e/ou Patronal). E isto não se deve às cooptações do Governo de Luís Inácio, por incrível que pareça, antes, a uma verdadeira inclinação das direções sindicais em se mostrarem “competentes” para os seus associados. Como não são os órgãos executores das políticas oficiais (patronais) os sindicatos, para convencerem seus associados do êxito de suas intervenções, passaram a publicar mais e mais as ações positivas das gestões patronais e, assim, fazem uma “ótima” propaganda da “competência”, “presteza” e "dinamismo” dos seus patrões.

Mas, esse é outro assunto, só brevemente mencionado para justificar o porquê da leitura de Marx sobre o tema, justamente quando o “socialista” Hugo Chaves determina a “não renovação” da concessão do canal RCTV.

Chaves é acusado de censurar a imprensa venezuelana e se defende alegando que “não censurou o canal de televisão, mas, retomou o sinal para poder utilizá-lo na criação de um canal de INTERESSE PÚBLICO(?!)”.

Muito bem, a questão colocada para o cenário político mundial é muito mais complexa do que se fosse meramente um ato despótico de um governante enfurecido com o barulho da oposição jornalística.

Em primeiro lugar a liberdade de imprensa é um viés imprescindível da própria LIBERDADE geral. Ninguém é livre se não pode expressar suas idéias livremente; e desde Johannes Gutenberg a forma mais efetiva (dinâmica, ampla, sistemática, etc.) de expressar as idéias é a Imprensa.

Censurar a Imprensa, seja ela qual for, é um ato que se remete ao medievo; ou melhor, que faz quem censura se aproximar em tudo aos déspotas medievais.

Voltaire, o filósofo francês responsável por muitos dos ideais da Revolução de 1789, escreveu: “eu posso não concordar com o que você diz, mas daria minha vida pelo seu direito de dizer”. É de Marx a afirmação “quando uma liberdade específica é questionada, questiona-se toda a liberdade” e Trotsky, debatendo a questão da censura na União Soviética declarou: “oposição teórica se combate com teoria. Oposição armada, com armas”.

Ou seja, mesmo uma breve amostra do pensamento político mundial demonstra quão autoritária foi a atitude de Hugo Chaves. Não há nenhum precedente teórico que justifique a atitude do governante venezuelano. Ou pelo menos, nenhum precedente teórico que se julgue respeitável.

Mas, eu dizia, a questão vai além do evidente ataque à liberdade: Hugo Chaves expõe, nos tempos de hoje, um sério problema político visualizado ainda no pós Revolução Francesa. Um problema “genético” que assola esse sistema político chamado DEMOCRACIA e que se convencionou a ensinar que se trata do melhor de todos os regimes.

Proudhon (Pierre Joseph) já alertava em 1848 para os graves problemas de autoridade da “democracia” e Aléxis Tocqueville, mais ou menos pela mesma época, alertava que a “democracia” não podia se tornar numa espécie de “ditadura da maioria sobre as minorias”.

Pois bem no limiar do século XXI os alertas dos pensadores do século XIX começam a se transformar em fato. A Democracia começa a apresentar seus vieses de autoritarismo e de “ditadura” da maioria.

Hugo Chaves foi eleito... pela terceira vez. E as alterações na constituição executadas no seu segundo mandato à frente do governo venezuelano garantem que ele pode ser reeleito quantas vezes “o povo” desejar: afinal, democracia nada mais é do que a vontade do povo! Os “guardiões da democracia no mundo”, ou os que se acham com essa missão (americanos e, curiosamente, ingleses), nada podem fazer quanto ao DEMOCRATA Hugo Chaves. Muito habilidosamente ele encontrou no gene da democracia o caminho para perpetuasse no poder. E a estatização do monopólio petrolífero adicionado ao elevadíssimo preço que o produto alcançou nos últimos anos – graças à desastrosa política externa de George W. Bush – criou condições financeiras objetivas para que ele tivesse os recursos necessários para minimizar os efeitos da pobreza na Venezuela, garantindo-lhe imenso e agradecido apoio popular.

Atacar Chaves, que governa com apoio popular e tem maioria esmagadora no Congresso que também foi eleito legitimamente, é atacar a democracia. Democracia usada para a garantia do interesse privado, é verdade. Mas, não é assim também nas outras democracias? A diferença é que, geralmente, é o interesse do Capital e das Empresas que a democracia garante. Na Venezuela, é o interesse de Chaves e do seu grupo.

Surge então um outro problema. O Governo Venezuelano afirma, conforme transcrito acima, que não fechou o canal RCTV por motivos de censura, mas “para abrir um outro canal de interesse público”. E aí Chaves, que já encontrou um caminho democrático para se perpetuar no poder em nome do povo, agora decide o que seja de “interesse público” e age em nome desse “interesse público”, mesmo se este “interesse público” for de atacar a liberdade!

Hegel, o maior analista da sociedade burguesa, escreveu que esta sociedade tem a capacidade de “suprassumir”, (abarcar) as variações culturais formatadas como “evolução” social sem perder o referencial da tradição e, desta maneira, ampliar seus conceitos e ações sociais. Marx, que foi aluno dele, traduziu esta grande observação hegeliana com a seguinte máxima: "a história não apresenta problemas que a sociedade não esteja em condições de resolver".

Se estiverem certos os filósofos alemães estaremos, então, vivendo as dores do parto social de um novo regime político/social, que bem pode ser um aperfeiçoamento da democracia ou mesmo a inicio da substituição dessa. De uma forma ou de outra, nem todo parto é tranquilo... mas, todo parto é doloroso...

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